quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Alcoviteiros é Pouco!


Os Alcoviteiros
Textos como este (que, a bem da educação, me vou abster de qualificar) eram impensáveis há uns anos. Dirão que ainda bem, que se quebram tabus. Nem isso é verdade. A relação de Sá Carneiro com Snú chegou a ser usada politicamente por pessoas com enormes responsabilidades. Mas, em geral, há um pudor português, um pouco hipócrita, que faz com que não se envolva a vida privada dos políticos no debate. E ainda bem. A essa hipocrisia, como a outras, chama-se civilidade. Quem diz tudo o que pensa não é corajoso, é apenas idiota. E quem é sempre frontal não é sincero, é só inconsciente.
Mas com os comentários na net, a “conversa” permanente sem mediadores, Portugal vai perder a sua inocência. E isto não vai ficar melhor. É por isso que a única saída que resta a um político (ou a qualquer figura pública) é nem abrir um pouco a janela. Para poder dizer, à primeira pessoa que faça a mais inocente referência à sua vida familiar, “não lhe admito!” Não ser nem casado, nem solteiro, nem hetero, nem gay, nem bi. Às vezes uma pessoa distrai-se, mas não pode. Nos tempos que correm, temos de ser apenas personagens. A intimidade, essa, tem de estar bem longe dos olhares públicos. Porque não há qualquer pudor em usar a vida privada contra a pessoa pública, tem de defender com unhas e dentes os que lhe estão próximos. O amor já é suficientemente difícil sem milhares de alcoviteiros a comentar. E por eles, desculpem, tenho um desprezo sem fim. Porque usar os amores dos outros para os atacar é o maior acto de cobardia que me ocorre.
Só que este post tem um subtexto: o incómodo por haver mulheres públicas que são mais do que esposas de senhores importantes. Têm opiniões. Lutam por elas. Por vezes com violência. Terá a Fernanda influência nas opiniões de José Sócrates? Não faço ideia mas é provável. Ela, os amigos e amigas dele, os colunistas que ele lê, os seus assessores e ministros, os seus camaradas de partido. No fim é ele que decide o que quer e é ele que é julgado por o que decide. Qual é então o sentido do texto de Vasco Lobo Xavier? Transformar o tema num assunto de alcova e transformar a Fernanda numa espécie de Mata Hari das causas fracturantes. E isto revela o machismo profundo que vive dentro destas cabeças. As mulheres ou são esposas serenas, as grandes mulheres que estão “atrás” dos grandes homens, ou dissimuladas fêmeas que os manipulam, umas sarnas que lhes moem a cabeça quando eles chegam a casa cansados.
Só no dia em que esta gente conseguir, por um segundo que seja, olhar para uma mulher sem pensar de quem ela é esposa ou namorada é que ficaremos a saber que perceberam em que século vivem.

Daniel Oliveira no Arrastão

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