Há um fragmento de Walter Benjamin que só recentemente começou a ser lido. Chama-se O Capitalismo como Religião. Os argumentos que Benjamin aí esboça não são simétricos dos que levam geralmente a considerar o comunismo, e por vezes o marxismo, como uma religião. É que o capitalismo, lemos aí, não se define em relação a um dogma ou a uma ideia - é "uma religião puramente cultual, a mais extremamente cultual que alguma vez existiu". Um traço que define esse culto é a sua duração, o facto de ser permanente, celebrado todos os dias e a todas as horas, "todos os dias são dias de festa". E, na definição de Benjamin, o culto não é expiatório é culpabilizante. À luz deste texto, as palavras que mais se têm ouvido projectam-se com inaudita intensidade neste estado religioso do mundo, precipitado num movimento monstruoso. Uma dessas palavras "confiança" ( a palavra-chave), é a transposição da "fé" para um plano secularizado. E os teólogos dizem-nos que sem esta profana fé a "mão invisível" ( do mercado, isto é do Criador) nos atira para o inferno. Como haveríamos de duvidar , se até as setas dos gráficos bolsistas, quando apontam para baixo, se parecem com caudas do diabo?
António Guerreiro no Expresso
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